Autoridades do Texas demonstraram apoio a um novo currículo escolar público que incorporaria lições cristãs da Bíblia já no jardim de infância.
Em votação do conselho escolar estadual na terça-feira (19), oito dos 15 integrantes votaram para manter o currículo Bluebonnet Learning em uma lista de materiais de leitura e artes da língua inglesa que poderiam ser usados no ano letivo de 2025-2026 para um grupo que vai do jardim da infância ao quinto ano.
Adotar o recurso educacional opcional desenvolvido pela Agência de Educação do Texas pode render às escolas US$ 40 por aluno anualmente.
Quatro democratas e três republicanos se opuseram aos materiais.
Autoridades do Texas têm até a noite desta quarta-feira (20) para enviar revisões ao que está incluído no material de propriedade do estado com base em depoimentos públicos anteriores, disse o presidente do conselho escolar estadual Aaron Kinsey durante a reunião de terça.
Os integrantes do conselho farão uma votação final na sexta-feira (22).
Os materiais didáticos foram criticados como sendo “desproporcionais”, focando no cristianismo muito mais do que em outras religiões, um conflito refletido em debates anteriores no Texas e em outros estados liderados em grande parte por republicanos.
No ano passado, o estado permitiu que escolas públicas contratassem capelães (ministros) religiosos não certificados como conselheiros, e a legislatura pressionou para exigir que salas de aula de escolas públicas exibissem os Dez Mandamentos.
Uma lei semelhante no estado da Luisiana foi temporariamente bloqueada neste mês por um juiz federal por possível inconstitucionalidade, enquanto pais, professores e ministros de escolas públicas de Oklahoma entraram na Justiça para impedir uma ordem semelhante.
Entenda a proposta
Sob o currículo proposto mo Texas, uma aula de jardim de infância sobre a “Regra de Ouro”, por exemplo, levaria os instrutores a ensinar os alunos sobre o Sermão da Montanha de Jesus, do Novo Testamento da Bíblia.
O guia do professor para essa aula também menciona o islamismo, o judaísmo, o hinduísmo e outras religiões.
Outro guia de jardim de infância sobre apreciação de arte se concentraria principalmente no Livro de Gênesis da Bíblia e nas obras de arte inspiradas nele.
Um currículo da primeira série sobre “compartilhar histórias” ensinaria A Parábola do Filho Pródigo, do Novo Testamento da Bíblia.
A unidade da terceira série sobre a Roma antiga apresentaria uma seção dedicada à vida de Jesus e ao cristianismo no Império Romano.
E um guia de poesia para alunos do quinto ano incluiria salmos do Antigo Testamento ensinados junto com poemas de Robert Frost e William Carlos Williams. Nenhum outro texto de livros religiosos seria incluído na unidade.
Críticas e apoio à proposta
O Texas AFT, um sindicato que representa mais de 60 mil educadores de escolas públicas e equipes de apoio em todo o estado, afirmou que os materiais propostos “violam a separação entre igreja e Estado e a liberdade acadêmica de nossa sala de aula, mas também a santidade da profissão de ensino”.
Os materiais contêm “uma quantidade indesejada e desnecessária de referências bíblicas”, alegou sindicato.
A Agência de Educação do Texas, por outro lado, afirma que os materiais “foram desenvolvidos usando as melhores evidências da ciência cognitiva para garantir que os professores tenham acesso a materiais de qualidade e de nível escolar que permitam que os professores se concentrem em fornecer instruções da mais alta qualidade e fornecer suporte diferenciado aos alunos”.
Na segunda-feira (18), mais de 100 pessoas testemunharam por mais de sete horas a favor e contra os materiais.
Mark Chancey, professor de estudos religiosos na Southern Methodist University e professor de escola dominical, descreveu-os como “fundamentalmente falhos”.
As lições “ainda privilegiam claramente o cristianismo sobre outras tradições” e “fazem inúmeras alegações que são errôneas, inventadas ou simplesmente estranhas”, disse ele.
“Há mais lições sobre a Bíblia cristã do que sobre qualquer outro texto religioso. Há mais lições sobre Jesus do que sobre qualquer outra figura religiosa”, comentou Chancey a Sara Sidner, da CNN, nesta quarta-feira.
Ainda segundo o especialista, crianças muito pequenas podem levar esses contos bíblicos ao pé da letra, o que pode causar confusão.
Barbara Baruch, que é judia, também testemunhou em oposição aos materiais, dizendo: “Acredito que meus netos devem compartilhar a religião da nossa família”. Ela pediu às autoridades: “Não deixem o governo interferir na escolha religiosa de ninguém”.
Mas Jonathan Covey, diretor de políticas do grupo conservador Texas Values, afirmou que as lições Bluebonnet são “materiais apropriados para cada série que incluem tópicos religiosos contextualmente relevantes de uma ampla gama de religiões”.
“Sempre foi entendido que a religião tem um lugar na sociedade cívica americana”, adicionou.
Outro defensor dos materiais, Glenn Melvin, argumentou que as propostas não violam a “cláusula de estabelecimento” da Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que estipula que “o Congresso não fará nenhuma lei respeitando o estabelecimento de uma religião”.
A cláusula foi interpretada muitas vezes pela Suprema Corte dos EUA, incluindo no caso Engel v. Vitale, da década de 1960, em que o tribunal superior decidiu que era inconstitucional que escolas públicas liderassem crianças em idade escolar em orações.
“Apenas ler algumas das passagens da Bíblia não fará com que alguém se converta, como muitos estudiosos bíblicos não são cristãos”, disse Melvin.
Fonte: www.cnnbrasil.com.br