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EUA X China: Qual a posição do Brasil em meio às duas potências?

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva visita Pequim enquanto a China e os Estados Unidos buscam reduzir as tensões provocadas pela guerra de tarifas. Nesta segunda-feira (12), Pequim e Washington concordaram em reduzir as taxas sobre importações por 90 dias.

A viagem do presidente busca fortalecer laços com o maior parceiro comercial brasileiro ― uma relação que Lula descreveu como “incontornável” e “indestrutível” em discurso para empresários em Pequim.

Lula disse que a China “tem sido tratada como inimiga do comércio global quando, na verdade, se comporta como exemplo de país que busca fazer comércio com aqueles que foram esquecidos nos últimos 30 anos”. E criticou as tarifas lançadas por Donald Trump.

“Eu não me conformo com a chamada taxação que o presidente dos Estados Unidos tentou impor ao planeta Terra do dia para a noite”, disse o presidente brasileiro.

“Foi o multilateralismo depois da Segunda Guerra Mundial que garantiu todos esses anos de harmonia entre os estados, não foi o protecionismo. O protecionismo no comércio pode levar à guerra, como aconteceu tantas vezes na história da humanidade”, seguiu.

Lula já havia criticado as tarifas em conversa com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, com quem se reuniu em Moscou antes de seguir viagem para a China.

O governo Donald Trump sobretaxou os produtos brasileiros em 10%, a tarifa mínima. No caso da China, a alíquota escalou a 145%. Pequim retaliou com taxas de 125% sobre as importações americanas. A trégua veio nesta segunda-feira, mas analistas veem o anúncio com cautela.

Durante a visita oficial do presidente Lula, o governo brasileiro busca aumentar as exportações para a China, principal parceiro comercial do Brasil, em meio à disputa tarifária com os EUA.

O comércio com Pequim, por si só, não deve provocar desgaste nas relações com o Washington, mas há pontos de atenção para o Brasil, afirma Pedro Steenhagen, PhD em Política Internacional pela Fudan University, em Shangai.

“A China tem muita demanda por produtos brasileiros, principalmente as commodities. É uma relação superavitária para o Brasil, então existe a compreensão que a China é um parceiro inestimável”, observa Steenhagen.

“Mesmo durante o governo Jair Bolsonaro, apesar das tensões, o comércio cresceu, o que demonstra o amadurecimento da relação sino-brasileira”, acrescenta.

O analista afirma, no entanto, que há temas sensíveis, e aponta que o governo Donald Trump tem relacionado diferentes temas à segurança, o que torna esse equilíbrio mais complexo.

“O cenário é complexo e instável. O Brasil precisa navegar nessa crescente securitização de diferentes temas e equilibrar as relações que têm com a China e os Estados Unidos, mas também a Europa e outros atores internacionais”, conclui.

A analista internacional da CNN Fernanda Magnotta concorda que o estreitamente de laços com a China não necessariamente prejudica a relação com os EUA, desde que o Brasil mantenha sua tradição de autonomia.

“O país atua como um equilibrista, buscando manter boas relações com todos os polos de poder sem se subordinar a nenhum deles. Essa lógica é coerente com a estratégia histórica do Brasil, que privilegia o multilateralismo, a mediação e a construção de pontes”, afirma Magnotta, que entende a visita de Lula à China como parte da estratégia de evitar alinhamentos automáticos na política externa brasileira.

“Na prática, o equilíbrio brasileiro entre grandes potências depende da clareza com que o país afirma seus interesses e evita ser instrumentalizado em rivalidades que não são suas”, acrescenta.

Nesse sentido, especialistas em relações internacionais ouvidos pela CNN destacam a decisão do Brasil de não aderir formalmente à Nova Rota da Seda, o megaprojeto de infraestrutura da China, como sinalização de que o país busca manter sua independência.

O governo brasileiro afirma que os laços com a China não se contrapõem ao interesse em manter boas relações com os Estados Unidos.

O professor de Relações Internacionais da FGV Vinícius Vieira observa, por outro lado, que há um distanciamento entre Brasil e Estados Unidos desde que Donald Trump voltou à Casa Branca, mas observa que isso não ocorreu apenas do lado brasileiro.

“O Brasil está afastado dos Estados Unidos não apenas por vontade brasileira, mas também pela falta de uma agenda dos EUA para o Brasil. Isso não é de agora, mas ganha força com Donald Trump”, afirma Vinícius Vieira.

O analista ressalta que, sob o governo Joe Biden, houve uma aproximação a partir de interessem em comum com Lula em questões como combate às mudanças climáticas e à exploração no trabalho, mas Donald Trump não sinalizou o mesmo interesse no Brasil.

Além das questões ideológicas, Vinícius Vieira acredita que as declarações de Lula durante a campanha nos Estados Unidos podem ter tido impacto nesse sentido. O presidente apoiou abertamente a democrata Kamala Harris, que terminou sendo derrotada pelo líder republicano. “Isso sem dúvida fecha portas”, afirma.

Outro ponto que pode pesar para os dois lados, na avaliação de Vieira, é a proximidade com as eleições presidenciais no Brasil. “O governo Donald Trump pode apostar no retorno da direita brasileira no que vem e a direita certamente vai tentar usar esse distanciamento dos Estados Unidos politicamente”, afirma.

Lula, por sua vez, poderia apostar no efeito que Donald Trump teve nas eleições do Canadá, onde a pressão dos Estados Unidos fortaleceu o Partido Liberal, que se recuperou nas pesquisas e conseguiu eleger Mark Carney como primeiro-ministro.

“Pelo menos enquanto não houver uma definição no Brasil ― se a esquerda, a direita bolsonarista ou uma direita mais moderada vai vencer as eleições ― as relações com os Estados Unidos devem se manter frias como estão. Isso é negativo não só para os investimentos e os negócios, mas também para os dois países, que poderiam explorar mais os pontos que têm em comum independente das querelas ideológicas”, conclui.

*Publicado por Gabriella Lodi.

Fonte: www.cnnbrasil.com.br

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