Danielle Catton é o tipo de pessoa que guarda antigos cartões de aniversário, cartões de embarque e cartões de visita — coisas efêmeras que parecem errado jogar fora, mas não têm um uso específico. Essas peças de seu cotidiano ficavam acumuladas em uma grande caixa plástica até recentemente, quando ela descobriu uma YouTuber que a apresentou à prática do “junk journaling” – fazer diários a partir de tralhas que seriam jogadas no lixo.
O “junk journaling” consiste em pegar esses pequenos itens e colá-los em páginas de um caderno. Um híbrido livre de colagem, scrapbook e diário tradicional, esse hobby criativo está em alta atualmente. As buscas no Google por “junk journaling” dispararam no final de dezembro e início de janeiro, e inúmeros criadores no TikTok, Instagram e YouTube têm documentado seus processos e compartilhado dicas com seguidores.
Enquanto o scrapbook pode envolver a compra de kits de adesivos e papéis decorados para documentar uma ocasião específica, o “junk journaling” enfatiza o uso de materiais encontrados e reciclados: um adesivo de uma fruta, um folheto pego em um museu, uma embalagem de produto bonita demais para descartar. Puristas podem aderir à filosofia de usar apenas “lixo”, enquanto outros complementam retalhos reciclados com fotos impressas e outros elementos decorativos.
Para algumas pessoas, um “junk journal” é uma espécie de diário visual, com notas e pensamentos rabiscados nas margens. Mas também pode ser apenas um conjunto aleatório de materiais organizados no papel.
Catton, 37 anos, começou a praticar “junk journaling” há algumas semanas e já diz estar viciada. Além disso, dá a ela uma desculpa para reutilizar coisas espalhadas pela casa.
“Coisas que tradicionalmente iriam para o lixo agora ganham uma nova vida dentro de um diário — algo que posso olhar nos próximos anos”, diz ela.
Fazer diários ajuda a relaxar
Apesar do recente aumento no interesse, variações do “junk journaling” existem há algum tempo. A blogueira de artesanato Jennifer Perkins diz que pratica há mais de uma década, antes mesmo de saber que existia um termo para o que fazia. Ela considera o hobby uma iteração da produção de zines, produções autopublicadas que ela praticava quando adolescente nos anos 90 (e que está tendo seu próprio ressurgimento).
Perkins, 50 anos, também relaciona a forma aos diários de mídia mista, como o projeto “Destrua este diário” de Keri Smith, lançado em 2007, que incentivava os usuários a liberarem sua criatividade preenchendo e desfigurando suas páginas, e os Smash Books da K&Company, que estimulavam os usuários a colar ou fixar itens de seu dia a dia.
O “junk journaling” é uma válvula de escape criativa para Perkins — uma forma de descomprimir e canalizar sua energia em algo prazeroso. Ela tende a ser desestruturada em sua abordagem, deixando-se guiar pelo sentimento. Em uma página, ela colou uma lição de matemática de 1982, justaposta com a imagem de uma mulher com duas tranças pretas. Em outra, espalhou recortes de anuários vintage. Outra ainda é composta inteiramente de retalhos laranjas.
“Bastões de cola são meu Xanax”, diz ela. “Se eu precisar de um minuto para me acalmar e relaxar, pego um dos meus livros e uma pilha de coisas aleatórias… rasgo tudo e colo”.
A ciência parece apoiar sua afirmação. Um estudo do ano passado sugeriu que criar artes e artesanato poderia aumentar significativamente o bem-estar público, enquanto pesquisas anteriores descobriram que pode ajudar pessoas que sofrem de condições de saúde mental. Vídeos de “junk journaling”, com os sons suaves de papel amassado, são até mesmo uma forma de conteúdo ASMR.
Catton, que diz lutar contra várias doenças mentais, afirma que a prática está ajudando-a a processar suas emoções melhor do que apenas escrever sobre elas. Ela também aprecia o fato de que isso a força a se afastar das telas do telefone e do computador.
“É calmante e terapêutico, e me permite desligar um pouco meu cérebro”, acrescenta.
Apreciar as pequenas coisas
A tendência do “junk journaling” também aponta para outro fenômeno recente: um retorno ao analógico.
Diante de um dilúvio de conteúdo digital, as gerações mais jovens estão expressando um interesse por mídia física — livros impressos, revistas e CDs estão voltando à moda e, de forma mais ampla, as pessoas parecem estar ansiando por objetos que possam tocar.
Em uma época em que fotos, ingressos de cinema e mensagens vivem na nuvem, o “junk journaling” cria um registro tátil das experiências pessoais.
Tatyiana Gordon, 26 anos, foi atraída pelo “junk journaling” principalmente por esse motivo. Ela começou o hobby em junho passado e agora tem o hábito de colecionar lembranças físicas ao longo do dia para colocar em seu diário.
Com a incerteza em torno do futuro do TikTok, ela lembra que a mídia digital pode ser impermanente: as memórias que ela postou na plataforma podem um dia se tornar inacessíveis, mas colocá-las em seu diário de retalhos significa que ela sempre poderá revisitá-las.
Seu novo passatempo também a inspirou a encontrar alegria e beleza no mundano, uma prática frequentemente referida nas redes sociais como “romantizar sua vida”. Desde que começou a fazer “junk journaling”, ela aprendeu a apreciar itens que outros podem desconsiderar: papel de embrulho de um presente de Natal, um mapa da cidade coletado em uma parada de descanso, até mesmo o papel xadrez vermelho e branco que forra uma cesta de batatas fritas para viagem.
“Muitas vezes acabo fazendo “junk journaling” sobre memórias muito pequenas e específicas que, sem o espaço que criei para elas, provavelmente teria esquecido”, diz ela.
Recentemente, Gordon documentou uma visita matinal de sábado com seu parceiro a uma cafeteria na cidade. Ela levou para casa um cartão de visita, um pedaço do seu copo de café e o recibo do seu pedido, posteriormente organizando-os em uma página de seu caderno.
“É um pequeno momento em termos de uma semana, mas foi tão especial experimentar algo novo e fazer isso com meu parceiro”, diz Gordon. “Eu o tornei um pouco maior agora que é uma página permanente no meu diário”.
É fácil se sentir sobrecarregado e esgotado com o fluxo constante de notícias negativas em nossos telefones. Pelo menos por enquanto, Gordon diz que o “junk journaling” está proporcionando a ela algum alívio — e uma fonte fácil e econômica de diversão.
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Fonte: www.cnnbrasil.com.br