Era 12 de maio de 1955 quando o estado de São Paulo criou o primeiro corpo policial feminino da América Latina, sendo pioneiro no Brasil na inserção de mulheres na segurança pública. 70 anos se passaram e elas seguem mostrando o valor do trabalho feminino na Polícia Militar, agregando novas perspectivas e formas de lidar com determinadas ocorrências e outras situações na instituição que é quase bicentenária.
Na época, as primeiras integrantes ficaram conhecidas como “as 13 mais corajosas de 1955”. Elas foram designadas para funções assistenciais, com amparo e proteção a mulheres, idosos, crianças, adolescentes e migrantes, mas não podiam combater o crime diretamente como os homens policiais.
O número de vagas para mulheres foi crescendo ao longo dos anos até que, no fim da década de 1960, houve a unificação da Força Pública com a Guarda Civil, dando origem à Polícia Militar do Estado de São Paulo, incorporando as policiais femininas à instituição.
Desde então, o trabalho delas foi ampliado para atividades como policiamento de trânsito, rodoviário, escolar, ambiental, bombeiro, entre outros.
A coronel da reserva Vitória Brasília, hoje com 80 anos, viveu essa transição. Ela entrou na polícia em 1967. Fez Escola Superior de Sargentos e, em 1971, ingressou na Academia Militar do Barro Branco, que recebeu a primeira turma feminina, com o total de 21 mulheres. Na mesma época, a policial ainda cursava direito na Universidade de São Paulo (USP).
“O que a gente mais estranhou quando entramos na academia era aqueles homens grossos. Era uma gritaria só”, relembrou rindo. “Aprendemos tudo o que eles aprendiam, inclusive a manusear uma arma. Mas não era uma adaptação só para nós, passar a trabalhar e estudar ali com mulheres era novo para eles também”, afirmou Vitória.
Apesar das discriminações vividas na época — e segundo ela, mais por parte da sociedade do que pelos policiais homens —, a policial sabia onde queria chegar. Depois de uma vida dedicada à segurança e aos estudos, em 1997 alcançou o cargo mais alto da instituição, o de coronel, e passou a liderar o Comando de Policiamento Feminino (CPFem), com mais de 4 mil policias em todo o estado.
Só em 2000, a estrutura dos batalhões femininos foi extinta e o serviço passou a ser misto em todas as unidades policiais do território paulista. Onze anos depois, o quadro que separava a formação de mulheres e homens para entrar na PM também foi desativado. Se antes havia apenas 5% ou 10% de vagas para mulheres, atualmente não há mais essa distinção. O mesmo valeu para a possibilidade de efetivação.
“Sou muito encantada pela Polícia Militar, principalmente por essa aceitação da profissional feminina. Na minha época era um choque ver uma mulher armada. De tudo isso, a principal lição que tirei é que a mulher pode ser e fazer absolutamente tudo o que quiser”, disse a coronel.
Interesse por entrar na polícia veio por meio do jornal
Vitória havia se formado no colegial na área de contabilidade, mas não se adaptou muito aos números e buscava novos rumos profissionais. Foi então que o pai dela, um leitor assíduo de jornais, mostrou à filha uma reportagem sobre policiais femininas. Ela leu, se interessou e estudou para entrar na instituição.
Assim que conseguiu, quando o policiamento feminino ainda era subordinado à Guarda Civil, a policial chegou a trabalhar com a coronel Hilda Macedo, a primeira mulher a comandar a Polícia Feminina. “Ela era muito ríspida, exigente e brava, nós tínhamos até um certo receio. Hoje, com toda experiência que tenho, entendo que o contexto da época exigia que ela fosse assim”.

A demora para a mulher chegar à polícia
Se contar que a Polícia Militar de São Paulo, antiga Força Pública e Guarda Civil, existe desde 1831 e as mulheres só puderam entrar em 1955, houve uma demora de mais de 120 anos. Para a major Sheila Berbel, que realizou uma tese de mestrado recente na USP sobre as gerações de oficiais femininas na corporação, “existe um lapso temporal de amadurecimento social”.
“Houve uma resistência social à presença de mulheres na segurança pública devido a visões tradicionais sobre o papel feminino”, disse. “Somos frutos de uma sociedade patriarcal. Isso não é só no Brasil, é mundial, então a evolução vai acontecendo”.
Ainda segundo a major, quando a policial feminina passa a estar perto do masculino, seja estudando ou trabalhando, ela percebe que tem tantas condições quanto o homem.
Para a tese de mestrado, Sheila realizou entrevistas com representantes de turmas de 1988 a 2023. A conclusão foi que a formação unificada, especialmente entre os oficiais na Academia do Barro Branco, mudou a percepção institucional e a forma como as mulheres prestam serviço.
“Hoje temos mulheres policiais que comandam batalhões de choque, que são pilotas de aeronaves, que vão para operações delicadas em comunidades, e fazem um trabalho excepcional, admirável. Elas desempenham um papel fundamental na segurança pública”, concluiu.

Fonte: www.agenciasp.sp.gov.br