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Lula e a Comunicação, por Elaine Tavares

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Lula e a Comunicação

Não é de hoje que temos dis­cu­tido a falta de um pro­jeto de co­mu­ni­cação no go­verno Lula. Já foi assim nos pri­meiros man­datos e segue agora no re­torno. Existem ações iso­ladas, sem li­gação umas com as ou­tras e não há uma es­tra­tégia eficaz para dar com­bate a toda en­xur­rada de de­sin­for­mação e men­tiras que tra­fega pelos meios de co­mu­ni­cação co­mer­ciais e pelas redes so­ciais. Pois agora, Lula fala em criar um canal de te­le­visão com al­cance in­ter­na­ci­onal. Opa! Parei para prestar atenção. Mas, ao apro­fundar o tema, mais uma de­cepção.

A pro­posta do pre­si­dente é de criar um canal in­ter­na­ci­onal, tipo a Te­lesur da Ve­ne­zuela. Só que em vez de se­guir a ló­gica da emis­sora criada por Chávez, que é de pro­moção da Pá­tria Grande e da di­vul­gação das grandes lutas dos povos, a ideia de Lula, ex­posta de ma­neira clara, no seu dis­curso dentro do pro­grama Con­versa com o Pre­si­dente, é ter um canal para “di­vulgar a cul­tura, as opor­tu­ni­dades de tu­rismo e de ne­gó­cios no Brasil”. Im­pos­sível uma pro­posta tão es­pe­rada criar mais de­cepção.

E disse ainda: “Não pode ser que se que­remos ver no­tí­cias do Brasil quando es­tamos fora te­nhamos de ver a Te­lesur, que é um canal ve­ne­zu­e­lano. Temos de mos­trar nossas ri­quezas ao mundo”. Ora, a Te­lesur não é um canal ve­ne­zu­e­lano, é la­tino-ame­ri­cano, e sua pro­posta sempre foi a de mos­trar a cara da Amé­rica La­tina, nas suas lutas e na sua be­leza. Não nasceu para vi­a­bi­lizar ne­gó­cios nem para in­cen­tivar o tu­rismo.

Lula in­formou que já de­mandou ao mi­nistro das Co­mu­ni­ca­ções, Paulo Pi­menta, um es­tudo para a cri­ação deste canal in­ter­na­ci­onal. Se­gundo ele não será para mos­trar o go­verno, nem o con­gresso, mas o Brasil tal qual é. “Mos­trar a cara do Brasil lá fora”.

A fala do pre­si­dente mostra aquilo que já apon­tamos muitas vezes: não há um pro­jeto de­se­nhado e claro para a co­mu­ni­cação como um todo, capaz de fazer frente a co­lo­ni­zação mental a que es­tamos sub­me­tidos. Tanto que a pro­posta do canal é de ser in­ter­na­ci­onal, ou seja, para ser visto fora do Brasil. Não se sabe ainda se no de­senho da emis­sora está também a pos­si­bi­li­dade de ser aberta, para o pú­blico in­terno, sem a ne­ces­si­dade de an­tenas pa­ra­bó­licas. Na ver­dade não há nada pen­sado ainda.

Também pre­o­cupa o que pa­rece ser o prin­cipal ob­je­tivo: ga­rantir ne­gó­cios, chamar in­ves­ti­mentos, fazer girar a roda do ca­pital, apa­ren­te­mente sem a pre­tensão de mudar a es­tru­tura de ma­nu­tenção da mais-valia ide­o­ló­gica, tí­pica dos ca­nais de te­le­visão co­mer­ciais, que apenas mantém as pes­soas pri­si­o­neiras da ló­gica con­su­mista e ca­pi­ta­lista.

Assim, o que po­deria ser uma boa ideia, acaba es­bo­ro­ando no ar da at­mos­fera li­beral. Sempre é bom lem­brar que Chávez, quando as­sumiu o go­verno na Ve­ne­zuela, traçou um plano de co­mu­ni­cação cer­teiro e eficaz, apro­vando a Lei Re­sorte – que ga­rante as con­di­ções ma­te­riais para a pro­dução de con­teúdo de ca­ráter po­pular – , cri­ando emis­soras de te­le­visão com al­cance na­ci­onal abertas, para re­pro­dução de con­teúdo pro­du­zido pelos mo­vi­mentos so­ciais, para a di­vul­gação da ver­da­deira his­tória da Amé­rica La­tina e da Ve­ne­zuela, apoi­ando ver­da­dei­ra­mente a co­mu­ni­cação co­mu­ni­tária, enfim, todo um pa­cote que se con­fronta com a co­mu­ni­cação co­mer­cial a ser­viço do ca­pital. Além disso, a Te­lesur se propõe a ser um canal la­tino-ame­ri­cano. Claro, Chávez tinha uma pro­posta po­lí­tica clara de ca­mi­nhada ao so­ci­a­lismo. Coisa que não dá para es­perar de Lula.

É claro que é im­pos­sível trans­plantar o exemplo da Ve­ne­zuela, mas é im­por­tante co­nhecê-lo para que saibam o que é ter um pro­jeto de eman­ci­pação e de so­be­rania co­mu­ni­ca­ci­onal. Não eram bra­vatas ao vento. Era uma to­ta­li­dade em con­tra­ponto com a ló­gica co­mer­cial/li­beral. Aqui no Brasil es­tamos longe disso. A pro­posta, ao que pa­rece – há que ver como vai ca­mi­nhar – é usar o canal para atrair in­ves­ti­mentos de fora.

E para dentro, Lula, o que te­remos? Como o go­verno en­fren­tará a in­ves­tida da ul­tra­di­reita, que segue viva e atu­ante, tri­lhando em alta ve­lo­ci­dade as es­tradas das redes so­ciais, pre­pa­rando a to­mada de pre­fei­turas e câ­maras de ve­re­a­dores em 2024. Quando te­remos um pro­jeto de in­for­mação para nossa gente, com jor­na­lismo que seja forma de co­nhe­ci­mento, com do­cu­men­tá­rios que contem da nossa his­tória e da nossa vida, com so­be­rania e au­to­nomia? Quando?

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Elaine Ta­vares

Elaine Ta­vares é jor­na­lista e co­la­bo­ra­dora do Ins­ti­tuto de Es­tudos La­tino-Ame­ri­canos da UFSC

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