A associação entre edentulismo (perda total ou parcial de dentes) e o sistema cardiovascular vem atraindo a atenção dos cientistas, que tentam compreender a relação entre diferentes sistemas do corpo humano. Pesquisadores da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (Forp) e da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), ambas da USP, decidiram investigar quais variáveis influenciam essa relação.
O estudo apontou que pacientes edêntulos hipertensos – ou seja, pessoas sem dentes e com pressão alta – que não reagiam à medicação para pressão apresentavam em suas próteses mais bactérias patogênicas, cujas propriedades favorecem o aparecimento de doenças. Além disso, o tempo de edentulismo foi associado ao aumento da pressão arterial sistólica. “Pessoas edêntulas não só têm mais chances de serem hipertensas, como também reagem pior aos medicamentos para hipertensão”, aponta Adriana Ribeiro, autora do estudo.
O hábito de fumar também interfere na microbiota oral e no perfil inflamatório, o que aumenta os riscos cardiovasculares. O fumo foi associado a maior presença de bactérias específicas em dentaduras e a níveis elevados de proteínas inflamatórias na prótese.
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Metodologia
Os pesquisadores analisaram 80 pessoas sem nenhum dente, divididas em quatro grupos. No grupo controle, nenhum participante era hipertenso. No grupo teste 1, os pacientes eram hipertensos diagnosticados, mas apresentavam pressão sistólica em níveis normais, por ação dos medicamentos. No 2, eram pessoas que nunca receberam o diagnóstico de hipertensão, mas que apresentaram pressão alta no momento de medição da pesquisa. O grupo final reunia pessoas diagnosticadas com hipertensão, mas que não reagiam à medicação e continuavam com pressão alta.
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Os pesquisadores avaliaram fatores sociodemográficos e clínicos, como hábitos de higiene, uso noturno de dentadura, consumo de nicotina, saúde oral e sistêmica, tempo de edentulismo, tipo de reabilitação (dentadura completa ou apenas superior). Para análise da microbiota oral, os pesquisadores coletaram saliva dos pacientes e o biofilme – comunidades bacterianas – da superfície interna das próteses.
Principais hipóteses
A pesquisadora explica que existem diferentes hipóteses para a associação entre edentulismo e pressão alta, que podem atuar de forma isolada ou em conjunto.
Uma das explicações é a sobrecarga do sistema circulatório. Os processos inflamatórios – que usualmente precedem a perda de dentes – desencadeiam uma cascata de citocinas (proteínas que orientam a região onde devem iniciar reações de proteção imunológica, ou seja, região que deve ser “abastecida” com mais sangue).
Quando esse quadro não é tratado, seja por medicamento, higiene ou acompanhamento médico, ele avança para um processo inflamatório crônico. No longo prazo, isso representa uma demanda excessiva para o sistema circulatório.
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“Todos os sistemas corporais estão correlacionados. Tanto o coração quanto a cavidade oral estão ligados à circulação. Se um desses mecanismos passa a exigir mais recursos, outros podem sofrer para operar com menos”, diz Adriana Ribeiro.
A pesquisadora ainda aponta que quando há perda de dente por doença periodontal – causada pelo acúmulo de biofilme na gengiva – a inflamação é capaz de enviar a bactéria para a corrente sanguínea. Uma vez no sangue, essa bactéria pode se alojar em qualquer parte do corpo, inclusive, no coração.
Esse risco é constante na saúde das pessoas edêntulas. Adriana explica que quando o paciente perde os dentes, a capacidade mastigatória é prejudicada e, por consequência, a saúde oral também: “Os alimentos são menos triturados e se acumulam com mais facilidade na cavidade oral.”
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Existem casos em que a pessoa com edentulismo opta por mudar sua dieta sem supervisão médica. “Muitas vezes, o paciente substitui os alimentos que consumia por versões mais macias e menos saudáveis. Exemplos dessas trocas seriam: (trocar) o pão pela bisnaga; o macarrão pelo miojo e a carne pela salsicha”, conta. Essa nova alimentação aumenta a probabilidade de diabetes e doenças gastrointestinais, o que também sobrecarrega o sistema circulatório e o coração.
Fonte: www.agenciasp.sp.gov.br